quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Sumaúma

Os poucos dentes que lhe restavam trincharam o naco de peixe. As mandíbulas de barranqueiro separaram com habilidade a carne das espinhas, atiradas para o canto da boca e cuspidas no chão batido.
Levantou-se da rede e observou a mãe remexendo no braseiro.
Ela estava com jeito de que ia fazer beiju.
Saiu para a beira do rio e foi sentar-se debaixo da sumaúma, mais velha que os homens na terra.
Gostava de matutar naquele lugar ouvindo o baque da água que fazia a curva se espremendo entre as pedras do morrinho antes de se espalhar com força no terreno mais baixo.
Pensou na mãe fazendo beiju.
A vista dela não prestava mais para a pesca, e ela gostava de pescar. Ele agora preparava os anzóis. Toma mãe, isquei prôce.
A mãe andava calada. Não contava mais nem a história do rei que ele gostava de ouvir.
O rei que mandava em tudo e morava no Rio de Janeiro.
A avó da mãe tinha contado pra ela quando moravam na cidade.
Foi uma festa muito grande quando ele visitou o povo.
Bandeirolas, banda de música e missa.
A mãe lembrava de tudo só se atrapalhava com o nome do rei, tinha vez que era Doutor Getúlio, tinha vez que era Dom Pedro II.
Queria ter conhecido a cidade. Só conhecia o rio e a mata.
A mãe dizia que a banda de música era uma coisa muito linda.
Tinha medo quando a mãe ficava calada.
Viu a sombra do dourado riscando o rio.
Esqueceu da cisma. Foi jogar anzol.





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